quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

VIDA

ARTIGOS ZERO HORA ED 15840 06 DE JAN DE 2008
Até quando?, por Gilda Pulcherio*
Recentemente tivemos notícias das mortes de dois jovens, um gaúcho e uma paulista, que sucumbiram após festas com ingestão de drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. Na ocasião, telefonou-me um jornalista de São Paulo que preparava uma matéria sobre as raves, perguntando se o Rio Grande do Sul, a exemplo de Santa Catarina, não dispunha de lei que proibisse a organização de raves. Ao que tive que lhe responder com um solene não! E que desconhecia algum movimento neste sentido.

Coincidentemente, eu lia o belo livro do médico Bernard Lown – A Arte Perdida de Curar. No capítulo sobre o lidar com a morte, Lown diz que “vasta aparelhagem entra em ação para servir mais à morte do que à vida”. Então me pus a pensar o quanto repudiamos liberar para a morte alguém que esteja só esperando por ela, mas facilitamos, e até estimulamos, como no caso do álcool, que jovens saudáveis com todo o futuro pela frente possam ir ao seu encontro em festas fartamente regadas a drogas e avalizadas por nós. Realmente é uma grande contradição.

Isto escancara a falta de empenho político em programas de prevenção ao uso de drogas em nosso país. Os pais não falam com seus filhos sobre drogas e as escolas oferecem, no máximo, algumas palestras ou oficinas no decorrer de um ano inteiro. Dá para aprender alguma coisa assim? Disciplina sobre drogas, nem pensar. Justo quando estudos brasileiros mostram que o conhecimento sobre as consequências do uso de drogas ilícitas, com o álcool não é assim, é um dos mais importantes fatores para a prevenção do uso entre jovens. Criamos alguns leitos para dependentes somente depois de muita pressão da sociedade.

Como nos contou uma mãe, em uma palestra, que se sentia completamente desamparada frente ao filho dependente de crack. Quando ele ficava sem dinheiro, “ia para as sinaleiras pedir moedas para comprar cola”. Quando ele ficava agressivo, ela “o acorrentava em casa e a polícia dizia que devia soltá-lo ou iria presa, que devia interná-lo”. “Se o levava para o posto, diziam que não havia vagas para a internação.”

Até quando vamos viver assim? Onde está o nosso empenho pela vida? Temos uma lei que proíbe dirigir após ingestão de álcool. Mas o que temos ouvido são depoimentos de donos de bares e restaurantes, assim como dos bebedores, de que não há mais preocupação com esta lei. Não há mais fiscalização como ocorria meses atrás. Realmente, estamos precisando de pessoas empenhadas em servir à vida e não à morte.

Bernard Lown lembra a compositora e cantora Joan Baez: “A gente não pode escolher como vai morrer. Nem quando. Só se pode decidir como se vai viver”.


*Psiquiatra – Instituto de Prevenção e Pesquisa em Álcool e outras Dependências

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